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Promover o alcance ao direito de proteção integral à criança, ao adolescente e ao idoso expostos aos conflitos familiares, através da promoção do conhecimento e desenvolvimento da sociedade.

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Projeto de Lei pretende instituir igualdade parental no Brasil.


Projeto de Lei pretende instituir igualdade parental no Brasil.
                                                                                                           Adriano da Silva 
Tramita na Câmara Federal, em caráter conclusivo, o importante projeto de lei número 1009/2011, que modifica a Guarda Compartilhada e determina que este modelo deve ser implantado pela autoridade judicial, sempre que os genitores estiverem aptos para o exercício do poder familiar, a menos que um deles expresse ao magistrado que deseja abrir mão da guarda do menor em favor do outro1.

A proposta original do PL 1009/11, que já era louvável, sofreu substancial alteração2 enquanto tramitou na CSSF (Comissão de Securidade Social e Família), melhorando seu teor, sempre no mesmo sentido da proposta original. Seu substitutivo foi aprovado por unanimidade naquela comissão3.
A justificação parlamentar para este projeto de lei encontra respaldo nos freqüentes equívocos de interpretação1 do espírito da legislação atual4 (mens legis) e da real intenção do legislador no momento da criação desta4 (mens legislatoris), por magistrados e operadores do direito em processos de guarda e visitas.
Dentre estes equívocos, está o caso do Art. 1584 §2º, que diz “Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, será aplicada, sempre que possível, a guarda compartilhada”1.
A controvérsia neste artigo fica sempre por conta da expressão “sempre que possível”, interpretada por alguns magistrados e operadores do direito como “sempre que os genitores se relacionem bem”. Interpretação um tanto descabida analisando-se todo o contexto do artigo e lembrando-se que, para genitores que se relacionam bem não seria necessária a criação da referida lei, uma vez que mesmo antes da criação desta lei nossa legislação já permitia a adoção desse modelo de guarda quando houvesse o aludido “consenso entre os genitores”1,4.
Desnecessário se faz a menção do quanto é natural que os pais e mães sejam o espelho e o suporte de toda criança em seu crescimento e formação. A criança tem o direito natural do acesso ao duplo referencial de pai e mãe, ainda que divergentes sejam as visões de mundo5, para que possam de maneira soberana, moldar sua própria personalidade em desenvolvimento. É rico o acesso completo ao referencial de ambos os genitores, bem como de toda sua família e seus ancestrais, e pobre o acesso à apenas um dos referenciais, ou seja, apenas um genitor ou grupo familiar.

Já existe a consciência coletiva, tanto no meio científico de saúde, quanto no meio jurídico, de que toda criança tem como necessidade básica de saúde mental, prioritária para seu desenvolvimento emocional, uma convivência familiar ampla7.
Antigamente a sociedade tinha como premissa que a mãe era a “cuidadora da prole” e o pai era o “provedor financeiro” da família. Na separação do casal, a guarda dos filhos era dada automaticamente à mãe e ao pai cabia apenas o custeio financeiro e visitas periódicas.
Com o tempo, essa lógica automática passou a não fazer tanto sentido, visto que a mulher ganhou espaço no mercado de trabalho, afastou-se um pouco da casa e o homem ganhou espaço no convívio doméstico e afetivo com a prole.
Hoje, não são poucos os casos onde a mulher trabalha e tem remuneração financeira superior ao homem, e o homem tem melhor manejo para o cuidado com a prole do que a própria mulher. É o princípio constitucional de igualdade entre homens e mulheres que pavimenta também o caminho para a igualdade parental.

Assim, as separações passaram a ser mais dolorosas e traumáticas tanto para os pais, quanto para os filhos que são desligados de forma violenta de um de seus pólos parentais, o qual os laços afetivos são fortes e consistentes.
Alem disso, inúmeros estudos científicos ao redor do mundo apontam para a assimetria de equilíbrio na convivência e referencia parental como causa principal da endêmica presença de problemas psiquiátricos, uso abusivo álcool, entorpecentes e delinqüência juvenil. A conclusão é que as crianças que crescem sem o acesso aos seus referenciais e o afeto de ambos os pais estão mais propensas a se tornarem jovens e adultos com desequilíbrio emocional, dentre outros distúrbios decorrentes.
No direito positivo temos os princípios constitucionais que garantem o direito à integridade física e psíquica da criança, a prioridade da convivência familiar, dignidade da pessoa humana, solidariedade familiar e a igualdade entre homens e mulheres.
Temos também toda a legislação específica que discorre sempre no mesmo sentido.
Para entender melhor então o tamanho da importância desse projeto de lei, é preciso primeiramente mudar a cultura da busca pelo Direito.
É imperioso visar primeiramente à necessidade natural (emocional, psicológica, intelectual e biológica) da criança de ser cuidada, educada e orientada pelos dois pólos parentais, ou seja, ambos seus genitores.
Trata-se do direito da criança em ter acesso aos seus referenciais sagrados na natureza (o ideal psicológico de duplo referencial6) para a construção de sua personalidade. É alem de tudo, um direito natural, concernente ao poder familiar, como o próprio direito positivo já descreve.
Para eliminar em princípio uma confusão comum, é preciso destacar que a Guarda Compartilhada não pressupõe necessariamente uma divisão exatamente equânime de tempo de convívio da criança com ambos os genitores, embora seja esta também um interesse superior do menor a ser buscado.
A Guarda Compartilhada é “a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns.” - Lei 10.406/02 Art 1.583 § 1º – redação dada pelo Art. 1º da Lei 11.698/2008.
Logo, observa-se que a guarda compartilhada refere-se ao exercício conjunto, por pai e mãe, da “guarda jurídica”, ou seja, refere-se ao direito de reger a pessoa dos filhos, dirigindo-lhes a educação e decidindo todas as questões de interesse superior destes, independente de onde e com quem estes residam.
Por esse motivo, o PL 1009/11 pretende positivar expressamente na lei o entendimento de que a divisão equilibrada do convívio da prole com ambos seus genitores também deverá sempre ser buscada pelo magistrado, considerando sempre as situações fáticas e o interesse do menor.
Para pais que residem distantes um do outro, onde o convívio cotidiano da prole ficaria prejudicado com um deles, por questões fáticas da distância e das rotinas do menor, o PL 1009/11 também prevê que, na aplicação da Guarda Compartilhada, a cidade considerada base para a moradia dos filhos deverá ser a que melhor atender aos interesses destes.
Quando não for possível um livre acordo entre as partes, o projeto prevê ainda que o magistrado poderá utilizar-se de profissional ou equipe interdissiplinar para estabelecer mais rigidamente o período de convívio entre a prole e seus genitores, bem como suas atribuições, tendo sempre em vista a busca pelo equilíbrio nesta distribuição.
É um direito básico do menor, ou seja, seu superior interesse, que deverá sempre prevalecer, pois como sujeito incapaz, deve ser defendido em primazia.
Não deve o atendimento ao interesse superior da criança estar submisso a disposição ou a indisposição dos pais em atendê-lo. Não deve o genitor intransigente possuir poder de vetar o interesse do menor, usando como ferramenta a beligerância.
Muitas vezes a animosidade dos pais está ligada justamente à disputa pelo direito de conviver com a prole e de a esta fornecer referências para sua formação5. Porém esse direito é da criança, e negar isso é ser negligente com o menor.
Desta maneira o PL 1009/11 prevê uma nova alteração no Art 1.583 § 2º da Lei 10.406/02, dando a ele a seguinte redação: “Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja a guarda do menor”.
Aos adultos imaturos, é preciso impor limites, como se faz com crianças durante a sua educação. Para suas desavenças é preciso encontrar outras soluções, desde que estas não interfiram no compartilhamento da guarda6, pois esse direito é do menor e nele, não se mexe. O direito dos adultos termina onde começa o da criança, de ser cuidado e orientado por suas origens naturais.
Via de regra, o magistrado deve induzir a aplicação da guarda compartilhada.
Porém, nos casos onde um dos genitores se mostra intransigente no sentido de inviabilizar a aplicação de uma guarda compartilhada, a guarda unilateral deve ser deferida ao genitor que se mostra disposto a viabilizar a efetiva convivência do menor com ambos os genitores (não simples sistema de visitas)8, conforme prevê o Art. 7º da lei 12.318/2010. A guarda do menor jamais deve ser deferida como prêmio ao genitor individualista.
Em casos extremos, onde um dos genitores mostra-se completamente desestabilizado emocionalmente ao ponto de que o compartilhamento da guarda com este represente um risco para a integridade física ou psíquica do menor, necessário se faz a suspensão do poder familiar deste genitor, temporariamente, e o deferimento da guarda unilateral ao outro, pois nenhum modelo de guarda será adequado nessa situação9. O genitor desequilibrado deve ser induzido a tratamento.
É preciso que a justiça se faça de maneira equilibrada, preservando os interesses naturais da prole, antes mesmo da maior instrução da lide, porquanto as necessidades do sujeito em desenvolvimento não esperam a morosidade processual.
A simples presença fumegante do positivo e natural direito do menor, dá ao magistrado condições de estabelecer a guarda compartilhada mesmo provisoriamente, no início da lide, uma vez constatado que a prole já convivia com ambos os genitores antes da ruptura dos laços conjugais. Negar isso seria o mesmo que negar a capacidade de exercício do poder familiar, que é direito natural e presume-se estar presente em todo o sujeito de direito.
Em muitos casos, a separação conjugal é recente e ainda existem laços afetivos entre os genitores e a prole. A atuação de um genitor, ou mesmo da justiça, para promover esse distanciamento, configura alienação parental e deve ser coibida com urgência.
Para alterar uma situação natural e fática de convívio familiar (que era existente antes do rompimento da relação conjugal), é essencial que exista dilação probatória de um risco sério para o menor, sempre resguardado o direito ao contraditório, porquanto a presunção natural seria de que o convívio familiar é benéfico.
Nesse sentido, o PL 1009/2011 estabelecerá para o Art. 1585 ainda da lei 10.406/02, novo texto expressando em síntese que “Em sede de medida cautelar de separação de corpos, em sede de medida cautelar de guarda ou em outra sede de fixação liminar de guarda, a decisão sobre guarda de filhos, mesmo que provisória, será proferida preferencialmente após a oitiva de ambas as partes perante o juiz, salvo se a proteção aos interesses dos filhos exigir a concessão de liminar sem a oitiva da outra parte, aplicando-se as disposições do art. 1.584”.
Buscou o legislador nesse trecho, suprir uma demanda social básica, onde atualmente a morosidade da justiça termina por perpetrar os desmandos de quem deseja alijar o menor do convívio natural com seu genitor10, seja por ignorância, insanidade, satisfação de seu ego ou qualquer suposta “proteção do menor” descabida, que acabaria por prejudicá-lo.
A alienação parental definida na lei 12.318/2010 como ilícito e como abuso moral contra a criança, também consiste, conforme a redação da lei, em qualquer atitude que cause prejuízos à manutenção de vínculos entre a criança e um de seus genitores ou ainda que dificulte o convívio ou o exercício do poder familiar. Esse entendimento já está confirmado em diversas jurisprudências11.

Desta maneira, o PL 1009/11 poderá evitar boa parte dos impasses existentes nos processos de família, onde um genitor tenta impor-se ao outro como pai ou mãe da prole, esquecendo-se de que ambos, por natureza, tem poder familiar igual.
Desnecessário se faz a busca pelo judiciário se ambos são iguais perante a lei e perante a justiça, e isso fica mais claro ao cidadão comum diante da guarda compartilhada6.
A injusta situação de assimetria no convívio afetivo entre a prole e seus genitores, bem como a injusta diferença de poderes atribuídos entre estes, fomenta um ambiente de descontentamento, inconformismo (com razão), beligerância e alienação parental que muitas vezes acaba por promover o abandono afetivo da prole pelo genitor não guardião. Desigualdade não é justiça!
É muito comum que o interesse de um genitor guardião colida diretamente com o interesse do menor, por conta do desequilíbrio emocional dentre outras fragilidades humanas. Em muitas dessas ocasiões, é negado à legitimidade do genitor descontínuo para pugnar judicialmente em favor do menor.
O PL 1009/11 garantirá que o poder familiar legitime ao seu detentor, representar os interesses da prole judicialmente, cobrar prestação de contas, cuidados com o menor e dar ou negar permissão para que este se mude de residência, independente de quem detenha a guarda.
Neste ponto ainda reforça a impossibilidade do guardião mudar-se de residência para local distante impedindo o convívio familiar da prole com o outro genitor, situações clássicas de alienação parental.
Por fim, o PL 1009/11 prevê ainda multa pecuniária para estabelecimento público ou privado que se recusar a dar informações dos filhos a um de seus genitores, mesmo que este não detenha a guarda dos mesmos.

Este projeto de lei proverá em nossas varas de família o padrão pela adoção de uma igualdade parental, mesmo que compulsória, prática já adotada com sucesso em muitos países desenvolvidos12, a exemplo dos Estados Unidos, Reino Unido, entre outros (Pesquise por Joint Custody, Legal Custody Physical Custody).
Assim a aprovação do PL 1009/11 se faz urgente e necessária, por representar a indução do suprimento de uma demanda social gigantesca por justiça, com impacto profundo na afetividade das famílias, no cotidiano social, no presente e no futuro da nação.

[1] Farias de Sá, Arnaldo - Interior do Projeto de Lei 1.009/2011 original e sua Justificação pelo autor - Câmara dos Deputados. 

[2] Teor do substitutivo final do Projeto de Lei aprovado na CSSF (Comissão de Securidade Social e Família da Câmara dos Deputados)

[3] Parecer da comissão de Securidade Social e Família, pela aprovação do Projeto de Lei 1.009/2011 - Câmara dos Deputados.


[4] Fier, Florisvaldo (Deputado Federal Doutor Rosinha) - Parecer e Voto do Relator na CSSF - Câmara dos Deputados


[5] Leila Maria Torraca Brito, Revista do Direito do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, Jurisprudência Temática, Vol 81.
[6] Jurisprudência STJ, REsp 1.251.000 - Nancy Andrighi, Fátima.
[7] Dias, Maria Berenice - Filhos da Mãe - Artigo

[8] Perez, Elízio Luis - Constatava-se Cegueira do Estado em Relação à Alienação Parental - Consolidador do anteprojeto que deu origem à lei 12.318/2010.

[9] Grisard Filho, Waldyr. Guarda Compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, pag. 205
[10] Lagrasta Neto, Caetano - O que é Síndrome da Alienação Parental, Revista Consultor Jurídico, Artigos, 17-Set-2011

[11] sobre Alienação Parental, Jurisprudências - TJ/SP Apelação 990.10.217441-7, TJ/PR Agravo de Instrumento 823738-3, TJ/RS Agravo de Instrumento 70053490024
[12] Madaleno, Rolf. Curso de Direito de Família. 4ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p.435

Adriano da Silva é Empresário, Técnico em Informática e Pai.

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